4 de dez. de 2011

A varíola - Orthopoxvírus variolae

A varíola é uma doença infecto-contagiosa provocada pelo vírus Orthopoxvírus variolae, um dos maiores vírus que afeta o ser humano. Foi conhecido quando uma múmia de 1550-1307 a.C. apresentava vestígios do vírus. Ao entrar no organismo humano, o vírus se hospeda em uma determinada célula, onde fabrica suas proteínas e multiplica-se no citoplasma da mesma. O sistema imunitário do organismo reage contra o vírus destruindo as células antes que o vírus se multiple, porém o sistema imunitário não consegue bloquear completamente a multiplicação do vírus, pois a proteína que produz faz com que o mesmo fique resistente aos anticorpos.


A transmissão da doença ocorre através do contato com pessoas doentes e pelos objetos utilizados por essa mesma essoa. Após 14 dias de incubação a doença começa a se manifestar, os primeiros sintomas são: febre, mal-estar, fadiga, dores pelo corpo, manchas avermelhadas, vômitos e náuseas. As manchas avermelhadas que aparecem na pele se transformam em bolhas purulentas que após um período secam e formam crostas.


Como a doença fragiliza o sistema imunitário do indivíduo há grande possibilidade de, nesse período, contrair novas doenças e infecções. Como é uma doença provocada por vírus, não existem tratamentos específicos, sendo que a preocupação é voltada para as seqüelas que a doença pode deixar. A doença pode ser prevenida através da vacina que cria imunidade contra o vírus. Atualmente, a varíola é uma doença praticamente extinta já que há tempos não faz vítimas (1980), porém existe a preocupação de existirem armas químicas com o vírus. 

Variolação, a primeira vacina:

Foi a doença precursora das vacinas, tanto antigas quanto modernas, uma vez que as pessoas perceberam que só contraíam varíola uma vez na vida. Na África e na Ásia, por volta do ano 1000, deixavam as cascas de feridas secando no Sol, uma ótima maneira de matar o vírus com radiação ultravioleta – embora não soubessem na época. A casca seca era pulverizada e inalada pelas pessoas, processo chamado de variolação. Os persas engoliam as cascas. Já na Europa, as pessoas esfregavam o pus das feridas na pele e dentro do nariz.

Claro que nem sempre a variolação funcionava. Em muitos casos, a pessoa desenvolvia a doença normal, com a letalidade e cicatrizes típicas. Nesse sentido, a técnica usada pelos Asiáticos (de secar e inalar) era mais segura e eficiente.


Frasco com material para variolação.
 
Foi para a Europa durante os séculos 6 a 8, levada por invasores árabes, e voltou nos séculos 11 a 13 por conta das cruzadas. Durante o século 18, cerca de 400 mil pessoas morriam por ano de varíola. No império romano, em 180 d.C., matou o imperador Marco Aurélio. Aliás, a lista de pessoas importantes mortas pela doença inclui vários reis e rainhas, da Inglaterra, Japão, China, Sião, Etiópia, Áustria, Espanha, Rússia, Suécia, França e outros (veja a lista completa na referência ao final do texto). Ainda no século 20, matava mais de 2 milhões de pessoas por ano.

Armas e germes:


Mas ela acabou ajudando os europeus e tendo um papel decisivo na conquista das Américas. Embora em números absolutos a Peste Negra tenha sido a pior doença da antiguidade, proporcionalmente não foi. Claro que por ocorrer nos europeus, foi mais registrada e mais detalhada. Mas o estrago da varíola nas Américas foi muito pior:

Os europeus estavam em contato com a varíola por milênios, e grande parte da população era resistente à doença. Mesmo entre os que desenvolviam a doença, a maioria tinha os sintomas, desenvolvia as feridas, mas não morria. Já os nativos das Américas, nunca tiveram contato com com o vírus, e morreram aos milhões. Muito mais importante do que a pólvora ou as armaduras foram as doenças que os conquistadores trouxeram. Gripe, peste bubônica, tuberculose e, entre outras, principalmente a varíola.

Quando Hernando Cortes desembarcou no México, em 1518, havia cerca de 25 milhões de habitantes, principalmente astecas. Em 1620 eles eram 1,6 milhões.

O imperador Inca Huayna Capar e seu filho sucessor morreram de varíola. A disputa entre os dois irmãos dividiu o império, e contribui em muito para a conquista dos Incas por Francisco Pizarro, que com um exército de menos de 200 soldados derrotou um exército de 80 mil incas, matando mais de 7 mil deles sem perder um homem, e capturando o rei Atahuallpa – a estratégia foi muito boa, além de contar com armas de fogo (arcabuz) e armaduras e espadas de ferro, contra roupas de pano e bordões de madeira, a ordem era para que os soldados matassem preferencialmente os incas mais enfeitados, com mais penas, que eram os mais altos em comando.

Os americanos atualmente têm a imagem de que o interior do país era vazio, mas estão errados. Antes dos colonizadores chegarem, populações inteiras foram dizimadas por doenças, principalmente a varíola. Sumiram tribos indígenas inclusive do Brasil.  Sir Jeffrey Amherst, comandante das forças britânicas na América do Norte, escreveu em uma carta para o coronel Henry Bouquet em 1763 que explica muito sobre a importância das doenças até na conquista do oeste, recomendando que os cobertores distribuídos para os índios fossem esfregados nas feridas de doentes, guerra biológica. A mesma mortalidade se repetiu depois, na conquista da Austrália e Nova Guiné.

Vaccinia, a vacina:


Por volta de 1780, um médico chamado Edward Jenner tomou conhecimento de que ordenhadeiras não tinham o rosto marcado pela varíola. Ele viu que as vacas tinham uma forma de varíola, a varíola bovina, que as ordenhadeiras contraiam mas desenvolviam sintomas mais leves, com pequenas feridas nas mãos, e nunca tinham a varíola normal. Em 1796, aproveitando que uma ordenhadeira tinha pego varíola bovina, ele raspou as feridas das mãos dela e inoculou em um menino de 8 anos – comitê de ética não era uma coisa tão popular na época. Depois de algumas semanas ele tentou variolar o garoto, expor ele à varíola normal, e o menino não desenvolveu nenhum sintoma. De vaca veio a palavra vaccinia, que virou vacina. Jenner tinha descoberto o uso do vírus atenuado, que não causa sintomas e protege da doença mais grave. Essa forma de vacinação, com um vírus atenuado, é usada até hoje para doenças como a pólio.

Fazendo uso do vírus atenuado, a varíola foi a primeira doença humana erradicada com a vacina. Em 1978, após uma campanha mundial de vacinação, ocorreu o último caso de varíola. Um fotógrafo contaminado em um laboratório americano, cujo professor responsável se suicidou depois que ele morreu. Os EUA mantiveram uma amostra de varíola no CDC (Cetro de Controle de Doenças), e a antiga URSS na Sibéria, ambos temendo o uso do vírus como arma biológica pelo outro. A OMS determinou que as amostras fossem destruídas em 1993, ninguém destruiu, depois em 1995, 1999 e em 2002 passou a determinar que as amostras fossem mantidas, para se desenvolver novas vacinas caso o vírus reapareça.




Rumores dizem que a Rússia teria deixado vazar algumas amostras do vírus, se não me engano isto é tratado no livro (ficção?) Demônio no Freezer, de Richard Preston, autor do ótimo Zona Quente. Nunca dei muito crédito pro assunto, até saber de um amigo próximo que viu de perto o local onde o vírus era guardado na Rússia. Segundo ele, o prédio não era uma unidade de armazenamento, e sim um bio-reator, local feito para produzir microorganismos. Vou ler o livro e conversar mais com esse amigo, quem sabe não tenho mais coisa para contar.

 

1 comentários

SORAYA 3 de junho de 2014 às 17:18

Foi de grande valia,gosteii!!!

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