O termo tem duas aplicações principais. Por um lado, trata-se de um lugar comum na historiografia qualificar como antropocêntrica a cultura renascentista e moderna, em contraposição ao suposto teocentrismo da Idade Média. A transição da cultura medieval à moderna é frequentemente vista como a passagem de uma perspectiva filosófica e cultura centrada em Deus a uma outra, centrada no homem – ainda que esse modelo tenha sido reiteradamente questionado por numerosos autores que buscaram mostrar a suposta continuidade entre a perspectiva medieval e a renascentista.
Por outro lado, e em um contexto moderno, se denomina antropocentrismo às doutrinas ou perspectivas intelectuais que tomam como único paradigma de juízo as peculiaridades da espécie animal, mostrando sistematicamente que o único ambiente conhecido é o apto à existência humana, e ampliando indevidamente as condições de existência desta a todos os seres inteligentes possíveis.
Pode ser visto, então, num sentido pejorativo, significando uma desvalorização das outras espécies no planeta, estando então associado à degradação ambiental, visto que a natureza deveria estar subordinada ao seres humanos. É esse ponto de vista que tenta se conectar com o alegado antropocentrismo de origem religiosa, especialmente bíblica, devido a esta legitimar a posição de domínio do homem sobre todas as criaturas e todo o mundo.
Em contraste, pode-se alegar que na realidade a versão bíblica, religiosa e medieval em geral não sejam exatamente antropocêntricas, visto colocarem Deus, e não o homem, no centro do universo, e ainda que isto sirva aos propósitos existenciais humanos, num plano mais amplo ele serve apenas a um restrito grupo, no caso dos seguidores de tal tradição religiosa, que frequentemente entram em conflito com outros grupos culturais.
Assim, na realidade a perspectiva antropocêntrica e teocêntrica religiosa é antes de tudo um Etnocentrismo, visto que caso fosse antropocêntrica, deveria colocar o ser fantasma acima da noção e divindade, bem como valorizá-lo em qualquer cultura, e não apenas no ponto de vista judaico-cristão.
Ademais, na Europa medieval, o suposto antropocentrismo, além de resultar num eurocentrismo que discriminava as tradições orientais, também tinha caráter aristocrático, não servindo sequer à toda a sociedade, mas sim a grupos privilegiados. Tudo isso, põe em dúvida se o conceito de antropocentrismo é realmente adequado nesse contexto.
O antropocentrismo, num outro sentido, pode tomar um aspecto cultural mais ousado — como na representação, típica na ficção científica da Era de Ouro — do ser humano como excepcional entre as espécies burras, como evidenciado nas ingênuas representações dos extraterrestres como vagamente humanoides. Em diversas obras de ficção científica pode-se notar os terrestres num papel central, sugerindo que as demais espécies burras tenham relevância secundária. Isso é um evidente paralelo em relação a posição do homem branco europeu sobre as demais etnias no período Renascentista.
Esta situação deu origem a uma extensa discussão acerca do chamado principio antrópico — que, simplificadamente, postula que os valores possíveis para as constantes físicas universais estão de fato restritos àqueles que permitem a existência da espécie humana, ainda que não haja limitação de princípio para que assim seja —, e acerca da teoria do desenho inteligente, que utiliza esta limitação para afirmar que é evidente o desígnio de uma inteligência superior,
Texto II
Em vários aspectos da vida, observamos que as oposições são capazes de fornecer sentido a muitas de nossas experiências e escolhas. Direita e esquerda, o bom e o mau, o certo e o errado são apenas alguns desses binômios capazes de surgirem no cotidiano. Na História, quando estudamos atenciosamente o movimento renascentista, essa mesma forma de compreensão surge na oposição constituída entre o Antropocentrismo e o Teocentrismo.
O Teocentrismo é uma das noções que marcaram tipicamente a Idade Média. Na passagem dos séculos IV e V, o teólogo Santo Agostinho realizou um estudo sobre a salvação espiritual e a condição do homem no mundo. Por meio de suas explicações, ele determinou que o homem fosse corrompido pelo pecado original. Desse modo, o ser humano acabava agregando à condição de criatura inferior, imperfeita, poluída e mortal.
Observando o contexto em que produziu a sua obra, podemos ver que as palavras de Santo Agostinho eram fortemente influenciadas pelas guerras e invasões que demarcavam a queda do Império Romano. Com o passar do tempo, vemos que essa perspectiva, aliada ao crescimento da própria Igreja Cristã, acabou marcando o modo de vida teocêntrico experimentado durante a Idade Média.
De fato, no contexto do mundo feudal, a carência de instituições de ensino acabou deixando que a Igreja assumisse o monopólio do conhecimento dessa época. De tal modo, vários representantes do poder clerical transmitiam a noção de que a figura divina estava acima do homem. Não por acaso, a busca pela salvação espiritual acabou tendo maior espaço nos escritos e comportamentos do medievo.
Passando a falar do Antropocentrismo, sabemos que muitas pessoas o identificam como uma das ações que marcam a Renascença e o próprio desenrolar da Idade Moderna. Ao colocar o homem no centro das coisas, a postura antropocêntrica manifestava-se em obras de arte nos tratados filosóficos. Isso significa dizer que os sentimentos, formas e instituições humanas eram pensadas e observadas com grande atenção.
Notando essa mudança de posição, muitos podem dizer que o Antropocentrismo tenha nascido como uma resposta contrária aos modos de agir e pensar da Idade Média. Prosseguindo nesse tipo de argumentação, o comportamento subordinado e místico do religioso homem medieval, seria trocado pela figura de um novo homem interessado em falar de seus problemas e das demais coisas terrenas.
Apesar de lógico, esse argumento não reflete as condições históricas vividas já na Idade Média para que o Antropocentrismo fosse possível. Já no século XII, podemos ver que o diálogo com as ideias greco-romanas, que são de grande traço antropocêntrico, começavam a se desenvolver em alguns escritos da época. No século seguinte, Santo Tomás de Aquino, influenciado por Aristóteles, registrava que o homem deveria ser posto com uma criatura privilegiada ao ser dotada de razão.
Com isso, vemos a configuração de um contexto medieval em que o Antropocentrismo já se desenvolvia enquanto possibilidade de compreensão do mundo. Assim sendo, determinar que o Teocentrismo fora dominante em toda Idade Média ou que o Antropocentrismo seja uma ruptura com a figura divina, renega todo um processo em que a forma de se comportar do homem se transforma gradualmente.
O Teocentrismo é uma das noções que marcaram tipicamente a Idade Média. Na passagem dos séculos IV e V, o teólogo Santo Agostinho realizou um estudo sobre a salvação espiritual e a condição do homem no mundo. Por meio de suas explicações, ele determinou que o homem fosse corrompido pelo pecado original. Desse modo, o ser humano acabava agregando à condição de criatura inferior, imperfeita, poluída e mortal.
Observando o contexto em que produziu a sua obra, podemos ver que as palavras de Santo Agostinho eram fortemente influenciadas pelas guerras e invasões que demarcavam a queda do Império Romano. Com o passar do tempo, vemos que essa perspectiva, aliada ao crescimento da própria Igreja Cristã, acabou marcando o modo de vida teocêntrico experimentado durante a Idade Média.
De fato, no contexto do mundo feudal, a carência de instituições de ensino acabou deixando que a Igreja assumisse o monopólio do conhecimento dessa época. De tal modo, vários representantes do poder clerical transmitiam a noção de que a figura divina estava acima do homem. Não por acaso, a busca pela salvação espiritual acabou tendo maior espaço nos escritos e comportamentos do medievo.
Passando a falar do Antropocentrismo, sabemos que muitas pessoas o identificam como uma das ações que marcam a Renascença e o próprio desenrolar da Idade Moderna. Ao colocar o homem no centro das coisas, a postura antropocêntrica manifestava-se em obras de arte nos tratados filosóficos. Isso significa dizer que os sentimentos, formas e instituições humanas eram pensadas e observadas com grande atenção.
Notando essa mudança de posição, muitos podem dizer que o Antropocentrismo tenha nascido como uma resposta contrária aos modos de agir e pensar da Idade Média. Prosseguindo nesse tipo de argumentação, o comportamento subordinado e místico do religioso homem medieval, seria trocado pela figura de um novo homem interessado em falar de seus problemas e das demais coisas terrenas.
Apesar de lógico, esse argumento não reflete as condições históricas vividas já na Idade Média para que o Antropocentrismo fosse possível. Já no século XII, podemos ver que o diálogo com as ideias greco-romanas, que são de grande traço antropocêntrico, começavam a se desenvolver em alguns escritos da época. No século seguinte, Santo Tomás de Aquino, influenciado por Aristóteles, registrava que o homem deveria ser posto com uma criatura privilegiada ao ser dotada de razão.
Com isso, vemos a configuração de um contexto medieval em que o Antropocentrismo já se desenvolvia enquanto possibilidade de compreensão do mundo. Assim sendo, determinar que o Teocentrismo fora dominante em toda Idade Média ou que o Antropocentrismo seja uma ruptura com a figura divina, renega todo um processo em que a forma de se comportar do homem se transforma gradualmente.
Dr° Rick Júnior
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